quarta-feira, 5 de abril de 2017

HOTI HUÑ









                        “Levai à minha  amada
                         Estas poucas e duras palavras...
                        Que ela não conte mais, como antes, com meu amor.
                        Por sua culpa, ele morreu,
                        Como, à margem do prado morre a flor,
                        Que a charrua, ao   passar, tocou”.
                        (Caio Valério Catulo, poeta latino,  em Carmen XI)


Salvador, 06 de fevereiro de 1975

                       ANA LUZIA,
Soube que você vai se casar. Cago pra isso, mas aqui estou como prometi,   te dizer algumas coisas que ainda não saíram de minha cuca.

                                                                                                                                                   Je me souviens de toi                 
Il souffit
J´attache la porte de ma voiture
Avec le cordon bleu.

Je me souviens de toi
Quand je prends mon bain
Au savon “chuvas de rosas”

Je me souviens de toi
Et je te déteste
Quand je me rapelle
De tes mensonges bourgeoises
Ah! ma petite fille!
Si tu savais  la douleur qui vient de toi
Pourrais-tu savoir ce qui se passe dans mon coeur?
Garde tes yeux de ma face.
Mon coeur pourra vaincre ma conscience.
Meu coração poderá vencer minha consciência.
Amiga. Amiga? Quero ser o teu demônio. O teu “amigo”, o teu “admirador” o teu detrator.  O imbecil que passou em tua vida. O madeiro que te  conduz ao silêncio. Os dejectos que jogas na latrina. O algoz que te leva ao cadafalso.
Ah! As mentirinhas pequeno-burguesas. Como fazem doer as minhas carnes! As intriguinhas. Os enredos pré-fabricados. A monotonia do que se entregam à mediocridade, dos que tem medo dos sentimentos fortes.
Se eu morrer amanhã. Ah!. Se eu morrer amanhã!. Dormirei la primeira noite fria no teu corpo quente.
O tal que estava esperando você e a prima, a loura, naquele dia lá embaixo na casa de Ivonete foi o Ivon. Mais uma das suas. Se eu chegasse naquela hora você tinha se mandado e eu ficava a ver navios. Aliás, fiquei. Você aproveitou o embalo e zangou-se de araque. Bruxa e criança, você é.
O rio leva a água pro mar. O mar solta pro ar. O ar descarrega no rio.
Passo pelo Hospital Português. Podridão. Pelo hospital português. Ódio. Hospital Português. Dedicação. Português. Amor. Arrependimento. Passo. Passas. Passo. Passas.
                  
Aquele chocolate sujou  mîa boca.
Aquele chocolate não deveria ter vindo
À minha boca.
Aquele chocolate  arde  minha boca.
Aquele chocolate
Teus olhos, chocolate, teus olhos;
Cortai
Todas as linhas para Brasília
Cortai
Todas as linhas pra Bel’ Horizonte
Cortai
As linhas do meu coração.
Eu nunca digo adeus
Nem, amém.






(Publicado  na Coletânea O RETORNO DA ESPERANÇA  -   Art-Contemp Editora, Salvador/Ba,1996 ).